segunda-feira, 18 de julho de 2011

54,5% dos motociclistas internados no IJF não têm habilitação


A maior parte dos condutores que sofreu acidente de moto e foi internada no IJF não tem habilitação. Mais de 60% é de adultos entre 20 e 40 anos, mas muitos deles são adolescentes


A média de internamento de um paciente vitima de acidente de moto no Instituto Doutor José Frota é de 40 dias (Foto: SARA MAIA) A média de internamento de um paciente vitima de acidente de moto no Instituto Doutor José Frota é de 40 dias (Foto: SARA MAIA)

A adolescente não faz cara de arrependimento. Aos 17 anos e mãe de duas meninas, a moça está internada pela segunda vez no Instituto Dr. José Frota (IJF). Vinha de uma festa, tinha bebido e guiava a moto quando uma retroescavadeira atingiu a traseira do veículo. Dessa vez, as consequências não foram só nela: o companheiro, 13 anos mais velho, está internado no cemitério de Milhã (301 km de Fortaleza). E a moça é teimosa. Assim que sair do hospital, pretende fazer duas coisas: visitar o túmulo do companheiro e, de preferência, conduzindo uma moto.



Sem carteira de habilitação, ela endossa a pesquisa realizada pelo médico Lineu Jucá, cirurgião vascular do IJF. Na dissertação de mestrado a ser defendida pela Escola Paulista de Medicina, na Universidade Federal de São Paulo, o médico verificou que a maior parte dos condutores atendidos pelo maior hospital de emergência do Ceará não são oficialmente motociclistas. Ou seja, 54,5% dos pilotos não tinham habilitação. A pesquisa foi realizada entre janeiro de 2007 e fevereiro de 2008. “A maioria das causas da violência no trânsito com moto é por falta de preparo e orientação”, descreve o angiologista. Para a surpresa do próprio médico, muitos adolescentes estão nessa contagem.

Um rapaz de 16 anos, com cara de menino, está entre eles. De Maracanaú, o estudante é amparado pela mãe. Já colocou pinos na perna direita e sabe da sorte de ter sobrevivido. Deve ser informado nos próximos dias se vai passar por cirurgia e, enquanto isso, conta que o incômodo é muito grande. Diz ter aprendido que o transporte não é para ele.

Mais de 100 pessoas aguardavam por vagas em enfermarias do Frotão na semana passada, conforme constatou O POVO em visita aos corredores da emergência durante dois dias. Algumas, já esperavam em macas nos corredores há meses. Para outras 20, a situação era ainda mais problemática: com saúde debilitada, esperam por leitos de UTI. “O atendimento é jocoso, precário e a culpa não é dos médicos. Olhando de longe, até parece que aguardam por um batizado universal”, julga Jucá. O motivo da lotação não é nada novo: a maior parte era de vítimas de acidentes com motos vêm de municípios do Interior (69,9% na pesquisa).

Os acidentes de trânsito já são um mal da saúde pública no Brasil. A moto traz 27,5% consequências mais graves para o condutor e passageiro se comparado com acidentes de veículos. “São bilhões de reais gastos com acidentes de moto que poderiam ser evitados”, reclama Lineu Jucá.

No dia da visita, Rosário dos Anjos, 38, estava internada há 18 manhãs, “fazendo cocô e xixi nessa maca”, segundo descreve. “Na frente de todo mundo, minha filha, só com a cobertura de um tecido. É muita humilhação”. Veio do sertão de Crateús (354 km de Fortaleza) e caiu da garupa da moto. “E a previsão de fazer a operação é bem dois meses”, desanima-se e, logo depois, recupera o sorriso. “Pelo menos a gente sabe que os médicos daqui são os melhores”, define.

Onde

ENTENDA A NOTÍCIA
Os custos de uma internação para acidentados de moto, em Fortaleza, chegam a R$ 176 por dia, de acordo com o Instituto Dr. José Frota (IJF). No ano passado, foram 6300 casos de internamento, a maioria do Interior (69%)

LEIA AMANHÃ
Sem deixar a moto Pesquisadores indicam que, por falta transporte público eficiente no Interior, pessoas que sofrem acidentes de moto não abandonam o veículo. A moto só é deixada de lado quando existe uma consequência muito séria, como uma amputação.

Dados coletados

PESQUISA
Os acidentes de moto cresceram 15,7% em 2010, em relação ao ano de 2009;

De acordo com o médico Lineu Jucá, os acidentes de moto são 27% mais graves que os de carro;

Conforme informações do próprio IJF, o custo médio de um paciente que sofreu acidente por moto é de R$ 176 por dia;

Em janeiro, fevereiro e março de 2010, foram 1.552 atendimentos a acidentes de motos no IJF;

No mesmo período de 2011, o número passou para 1.601;

60,1% dos acidentados de moto têm entre 20 e 40 anos;

58,8% dos acidentes acontecem em áreas urbanas das cidades;

62% dos acidentes de moto acontecerem sexta, sábado ou domingo;

A maioria dos condutores não tinha habilitação (54,5%)

opovo - 02.05.2011

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